quarta-feira, 10 de março de 2010

DECOLORES

Boletim Informativo do Movimento de Cursilhos de Cristandade
Arquidiocese de São Salvador – Bahia


EDITORIAL - Março/2010

Irmãos e irmãs em Cristo,

Escolhemos a oração da Campanha da Fraternidade 2010 como nossa primeira mensagem deste ano para todos os cursilhistas, como um chamamento a uma profunda reflexão. Vamos avaliar nossas ações e omissões, acertos, erros, e tudo em nós que possa nos levar a uma mudança de vida, uma mudança que nos aproxime sempre mais e mais de Jesus e poder dizer para os outros como Ele disse aos seus discípulos: Coragem! Eu venci o mundo (Jo 16,33).

ORAÇÃO
Ó Deus Criador, do qual tudo nos vem, nós te louvamos pela beleza e perfeição de tudo o que existe como dádiva gratuita para a vida.
Nesta Campanha da Fraternidade Ecumênica, acolhemos a graça da unidade e da convivência fraterna, aprendendo a ser fieis ao Evangelho. Ilumina, ó Deus, nossas mentes para compreender que a boa nova que vem de ti é amor, compromisso e partilha entre todos nós, teus filhos e filhas.
Reconhecemos nossos pecados de omissão diante das injustiças que causam exclusão social e miséria. Pedimos por todas as pessoas que trabalham na promoção do bem comum e na condução de uma economia a serviço da vida.
Guiados pelo teu Espírito, queremos viver o serviço e a comunhão, promovendo uma economia fraterna e solidária, para que a nossa sociedade acolha a vinda do teu reino.

Por Cristo, nosso Senhor. Amém.

GED Salvador.


CARTA DO ASSESSOR ECLESIÁSTICO NACIONAL DO MCC - MARÇO 2010
Pe. José Gilberto Beraldo

“Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e siga-me” (Mt 16,24).

Muito amados irmãos e irmãs, solidários na caminhada quaresmal rumo à Páscoa da Ressurreição!

Desde o momento em que terminei de redigir a última carta mensal, a de fevereiro, e quase como uma decorrência das propostas da Igreja para uma fecunda caminhada quaresmal, e já vislumbrando as celebrações da Paixão de Jesus que ocorrem em março (Semana Santa: 28 de março, domingo de Ramos a 03 de abril, Sábado santo, Vigília pascal), procurei deixar que minha vida de discípulo missionário buscasse saciar sua sede numa fonte preciosa: a fonte que brota de um mistério; do mistério da cruz, ou seja, do mistério do sofrimento. Entre muitas outras, em mim nasceram, então, algumas indagações a partir deste mistério já oferecido por Jesus a quem se dispõe a seguir seus passos nos caminhos da vida. Que sentido tem a cruz ou o sofrimento na vida do Filho de Deus? Por outro lado, que sentido tem a cruz, ou seja, o sofrimento na vida do discípulo? Por que para o discípulo missionário de Jesus a cruz ocupa um lugar e um momento privilegiados na sua peregrinação terrestre? Ainda que não tenha pretensão de dizer nada novo a respeito, juntos façamos uma pausa em algumas “estações” como numa curta via-sacra e reflitamos brevemente.

1. Primeira estação: a cruz na vida e morte do Filho de Deus. Trata-se de absorver um mistério. Mistério é algo que não encontra explicação dentro dos limites da inteligência ou da ciência humanas. Foge do natural. Não há como compreender que um Deus – Jesus, o Filho de Deus, Deus como o Pai e o Espírito Santo – venha carregar uma cruz e enfrentar sofrimentos, desde o seu nascimento até sua morte na mesma cruz. Só existe uma explicação, aliás, dada pelo próprio Jesus. Entre outras muitas, cito duas de suas próprias palavras: “Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mt 20,28). E a outra: “Ninguém tem amor maior do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13). É ou não é um mistério a cruz de Jesus? Tem alguma explicação humanamente plausível a não ser o amor de Deus Pai por suas criaturas? Cito um já conhecido autor místico de nossos dias, Anselmo Grun, que no seu livro “A Cruz”, afirma: “Por outro lado, a cruz é em João um sinal do amor de Jesus que nos amou até o fim, até os últimos extremos (cf.João 13,1). Por isso, a cruz colocada em nossas paredes deve nos lembrar sempre e em todas as circunstâncias em que estamos envolvidos pelo amor de Deus, que o amor de Deus se abaixa até a poeira de nosso dia a dia, para ali nos tocar e curar amorosamente em nossos aspectos mais vulneráveis. Nada está excluído desse amor de Deus. Dessa maneira, a cruz é um sinal de esperança, um sinal de amor”.

2. Segunda estação: o lugar ocupado pela cruz na vida do discípulo de Jesus. Não nos esqueçamos que estamos refletindo em tempo quaresmal, portanto, num especial tempo de conversão, de mudança, de transformação pessoal. Primeiramente, observemos os quatro elementos contidos na citação acima (Mt 16,24) oferecidos por Jesus: a) uma tomada de decisão; b) a renúncia; c) o abraço da cruz e, d) o seguimento. Em primeiro lugar, o discípulo ou aquele que deseja ser discípulo de Jesus, precisa tomar uma decisão firme e perseverante. De outra forma, não demorará a largar o arado. E, já sabemos: “Quem põe a mão no arado e olha para trás, não está apto para o Reino de Deus” (Lc 9,62). Depois, a renúncia, isto é, deixar tudo para trás, sobretudo tudo aquilo que atrapalha sua entrega, sua decisão - a começar pela renúncia a tudo o que contraria a proposta de Jesus no seu Evangelho. Em seguida - e aí está o centro da proposta do Mestre – abraçar a cruz. Jesus não diz que devemos abraçar a cruz dEle, a “minha cruz”, mas a “sua”, a nossa, a de cada um. Aliás, parece que vivemos dela nos queixando e lamentando pelo seu peso e pelo incômodo! A dEle não podemos carregar, simplesmente porque nela pesaram todos os pecados do mundo e de toda a humanidade desde os inícios até o fim dos tempos. Só os ombros de Jesus foram capazes de aguentá-la. Finalmente, seguir os passos dEle durante toda a vida. Só mesmo cada um, cada uma, cada pessoa saberá onde Jesus está pisando para poder segui-lo. Todo este tempo de Quaresma é propício para enxergar o caminho. A cruz será o nosso GPS!

3. Terceira estação: a sintonia da cruz do discípulo com a cruz do Mestre. Desde os meus velhos tempos de estudo da teologia, mas, sobretudo na entrega ao ministério sacerdotal, tentei apreender e aprender o sentido da participação do cristão nos sofrimentos de Cristo. É nas Cartas de São Paulo aos Filipenses e na Primeira de São Pedro que fui buscar, muitas e muitas vezes, aquela sintonia que não só consola o seguidor de Jesus mas abre horizontes ilimitados de participação nos sofrimentos dEle para, com Ele, participar da redenção do mundo. São Paulo chega a dizer que é através dos sofrimentos que se pode chegar não só a conhecer Jesus, como, até, ser semelhante a Ele: “É assim que eu conheço Cristo, a força da sua Ressurreição e a comunhão com os seus sofrimentos, tornando-me semelhante a ele na sua morte...” (Fl 3,10). De que mais precisamos para aceitar e assumir a nossa cruz de cada dia com entusiasmo e não já com um conformismo vazio? Mas, tem mais e com igual ou maior força: “Alegro-me nos sofrimentos que tenho suportado por vós e completo, na minha carne, o que falta às tribulações de Cristo em favor do seu Corpo que é a Igreja” (Cl 2,24). Confesso-lhes que esta corajosa e, até, ousada afirmação de Paulo tem servido não só para meu encorajamento pessoal e para renovação do meu entusiasmo e entrega, mas para consolar milhares de pessoas no decorrer de minha peregrinação sacerdotal! De fato, o que faltaria “às tribulações de Cristo”? Nada. Absolutamente nada. Paulo não acha assim. Pois ele afirma que cada um dos discípulos de Jesus aporta sua cota de sofrimentos que, como pertence a cada um, é, digamos, adicionada à cruz de Cristo “em favor do seu Corpo que é a Igreja”. Nesta mesma estação na qual estamos contemplando a sintonia da cruz do discípulo com a cruz do Mestre e para encerrá-la, não posso deixar de citar o Apóstolo Pedro na sua Primeira Carta: “Pelo contrário, alegrai-vos por participar dos sofrimentos de Cristo, para que possais exultar de alegria quando se revelar a sua glória. Se sofreis injúrias por causa do nome de Cristo, sois felizes, pois o Espírito da glória, o Espírito de Deus, repousa sobre vós” (1Pd 4,13-14). “Participar dos sofrimentos de Cristo”, portanto, nada mais é do que “renunciar a si mesmo, tomar sua cruz e segui-lo”! Meus caros irmãos e irmãs, junto com Cristo e Ele assemelhados pela cruz, prossigamos com coragem e com muita esperança nossa via-sacra quaresmal rumo à Páscoa da Ressurreição. Grave bem no seu coração a palavra de Paulo que repito para terminar: “Alegro-me nos sofrimentos que tenho suportado por vós e completo, na minha carne, o que falta às tribulações de Cristo em favor do seu Corpo que é a Igreja” (Cl 2,24). E mais: façamos de nossa cruz uma cruz de comunhão com a cruz de Jesus, uma cruz de parceria com as cruzes de nossos irmãos e irmãs para a salvação do mundo, hoje. Vamos acabar dando-nos conta que a nossa cruz, parecendo-nos demasiadamente pesada, será sempre muito mais leve que a cruz dos demais!
Um carinhoso abraço fraterno do amigo e irmão, companheiro na Via-sacra de nossas vidas, assemelhados a Cristo e à Mãe das Dores, Maria.



VOCÊS NÃO PODEM SERVIR A DEUS E AO DINHEIRO.
Dom Murilo S. R. Krieger, SCJ


A Campanha da Fraternidade faz parte do calendário anual de nossas dioceses. Promovida pela CNBB, esse Campanha procura inquietar a sociedade com reflexões sobre temas sociais, especialmente aqueles que prejudicam a vida fraterna. Em 2010, há uma particularidade: a Campanha outra vez será ecumênica – isto é, assumida, também, por outras Igrejas cristãs.

O tema escolhido para a CF 2010 foi: “Economia e Vida”; e o lema: “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24). Seu objetivo geral é unir as Igrejas cristãs e as pessoas de boa vontade na promoção de uma economia que esteja a serviço da vida, em vista da construção da paz. Seus objetivos específicos são denunciar a perversidade de um modelo econômico que visa ao lucro em primeiro lugar; educar para a prática de uma economia de solidariedade, valorizando a vida como o bem mais precioso; e conclamar as Igrejas e a sociedade para a implantação de um modelo econômico que respeite todas as pessoas.

Como se pode perceber, estamos diante de objetivos ousados. Mas como não ser ousado diante das injustiças que nascem de uma economia em que o lucro está em primeiro lugar e o ser humano não passa, muitas vezes, de um “produto”, útil apenas enquanto ajuda no crescimento dessa mesma economia? Como ficar indiferente diante de uma “máquina” econômica que gera desigualdade, miséria, fome e morte? Realizada na Quaresma, a CF quer “acordar” a sociedade, motivando-a a uma profunda conversão. Afinal, a Vida é um valor mais importante que os interesses do mercado.

A palavra “economia” vem do grego e significa, literalmente, “a administração da casa”. Sua finalidade é a de providenciar tudo o que é necessário para a sobrevivência. Uma constante no pensamento social cristão é o caráter humano da economia, como atividade realiza por pessoas, devendo orientar-se a serviço delas – isto é, as pessoas são o centro e a razão de ser da vida econômica.
Há os que perguntarão: tem sentido as Igrejas cristãs tratarem de um tema como esse? Não haveria outros temas mais interessantes e urgentes, que seriam mais “religiosos”?

Tudo o que é importante para o ser humano é importante para o Evangelho. Por isso é que Jesus se preocupou não somente como temas ditos “religiosos”, mas também com a fome, com as doenças e as injustiças. Ao advertir que não podemos servir a Deus e ao dinheiro, Cristo deixou claro que as injustiças de nosso mundo têm como causas a ganância e o egoísmo. As injustiças crescem, pois, quando o dinheiro e o lucro se tornam “deuses”, as pessoas passam a reverenciá-los, dev0otando-lhes seu tempo e suas preocupações. Quem, assim se comporta, deixa de amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, pois passa a servir, em primeiro lugar, ao b”deus” dinheiro.

Em síntese: a relação entre a fé e a vida é muito maior do que se imagina. Por isso, questões como justiça e solidariedade são constitutivas do anúncio do Evangelho – isto é, fazem parte integrante dele. Trabalhemos, então, para preservar a grande casa comum, o planeta Terra, planeta da vida e morada da família humana. Busquemos mudar a economia, dando-lhe um rosto humano. Saibamos agir motivados pelo desejo de servir ao Senhor. Servindo-o, além de lhe darmos o que Ele tem direito de receber de nós, suas criaturas, estaremos colaborando decisivamente para a construção de um mundo fraterno.


EU NÃO TE CONDENO!
André Bressane de Oliveira, SJ

No dia 21, celebraremos o quinto e último domingo da Quaresma. Este é um tempo especial para examinar como tem sido nossa vida de fé e nossa caridade para com os irmãos e mudar aquilo que tem de ser mudado. O texto desse domingo pode nos iluminar nesse caminho. Vamos ver!
Enquanto Jesus ensinava no Templo, algumas pessoas importantes da comunidade trouxeram uma mulher que tinha sido pega “com a boca na botija”. Todos sabiam que, para o crime dela, o costume era apedrejar até a morte. Mesmo assim, resolveram ver o que Jesus ia dizer, uma vez que tudo o que Ele ensinava tinha a ver com perdão, misericórdia, acolher o pecador e, inclusive, perdoar aquelas pessoas que nos fazem mal.
Diante da acusação, a primeira atitude de Jesus foi o silêncio. Eis algo muito importante que deveríamos aprender com Ele: quando encontramos alguém que está vivendo um período de sofrimento ou que fez algo errado, deveríamos primeiro ouvir, calar e rezar. Jesus não fica comentando a vida dos outros, nem se apressa em julgar. Ao contrário, primeiro acolhe a pessoa e deixa que as coisas se assentem. Só então diz o que tem de ser dito.
Quando chegou a hora de agir, Ele surpreendeu, porque, em vez de prestar atenção só no pecado da mulher, percebeu que o pecado está presente na vida de todos e ela era uma pecadora entre pecadores. Por isso, perguntou se alguém ali nunca havia pecado. Isso deixou todo mundo assustado, pois quem pecou também poderia ser apedrejado. Quando perceberam que apedrejando a mulher dariam razão para que os apedrejassem também, desistiram de fazer isso.

Eis uma situação muito comum na nossa vida em comunidade, em família ou no trabalho: diante de alguém que errou nunca faltam pessoas que queiram apedrejar. Quem nunca ouviu alguém da comunidade dizer: “Para mim, fulano morreu”? Isso é uma forma de apedrejar, pois mata a amizade e tudo o que aconteceu de bom antes do erro. É muito difícil encontrar quem tenha a coragem de acolher e ouvir aquele que errou...
Essa é uma das nossas maiores missões no mundo de hoje: esse é um testemunho que temos de dar. Isso porque só depois de acolher e de mostrar misericórdia é que nossa palavra ganha força e pode ajudar o outro a mudar de verdade. Temos de aprender com Jesus que termina esse Evangelho dizendo: “Eu não te condeno. Vai e, de agora em diante, não peques mais” (Jo 8,11).



DEUS ONIPRESENTE
Pe. Roque Schneider, SJ


Ismael, um sábio Hindu, tinha muitos discípulos em sua escola. Mostrava-se educado e justo com todos, mas nutria certa predileção por Abdul, o mais inteligente, cortês e atencioso de todos.

Seguidamente o elogiava, despertando inveja e ciúme nos colegas da escola. Um dia, o mestre falou ao grupo:

- Já percebi que vocês duvidam da lucidez e da inteligência de Abdul. Façamos uma experiência concreta, hoje: Todos saiam por aí e cada qual vai capturar dois ou três pássaros, OK?

Uma hora depois, um a um foram chegando com as aves capturadas na mão. E o mestre Ismael avisou:
- Agora, o segundo momento do teste de avaliação grupal. Busquem um lugar secreto onde ninguém veja vocês. Matem um dos pássaros e tragam-no depois até aqui, certo?

Em menos de uma hora todos regressaram triunfantes com uma ave morta. Surpreendendo, Abdul devolveu o pássaro vivo ao mestre.
- Por que não o mataste, como eu solicitei?

- Desculpe, nobre professor. O senhor ordenou que buscássemos um lugar onde ninguém nos visse. Por todos os locais onde andei, Deus estava a me ver e observar.

E o guru, mestre inspirado, rematou:

- Perceberam a diferença? Abdul teve um lampejo teológico, bíblico, espiritual. Na verdade, ninguém de nós consegue escapar do olhar atento e onipresente de Deus, nosso Pai.

Lição: Nas aulas de catecismo, o professor nos ensinava: “Deus está no céu, na terra, no mar, em toda parte. Ele é onipresente, Todo-Poderoso, nosso Pai”.